Como pesquisadores estão trabalhando para combater o greening? Doença que tem ameaçado a produção de laranja no Brasil e no mundo.
O segundo semestre de 2023 tem sido desafiador para os entusiastas de uma laranja fresca após o almoço. Os consumidores estão sentindo no bolso o estrago que o greening tem feito nos pomares. Acontece que a alta nos preços está diretamente ligada a escassez da fruta no mercado que está diretamente ligado a dispersão de uma bactéria (Candidatus Liberibacter) pelas plantas de laranja.
O greening, também conhecido como HLB, já causou estragos significativos nos pomares dos Estados Unidos e está ganhando força no Brasil e em outras partes do mundo. Para enfrentar esse desafio, a Dra. Mariângela Cristofani-Yaly lidera um grupo de pesquisa que busca explorar a genética das plantas cítricas em busca de mecanismos de defesa que possam impedir a bactéria de causar doenças nas laranjas.
Uma possível resistência ao greening
Uma das estratégias fundamentais no combate a doenças em plantas é identificar características de tolerância ou resistência em organismos vivos e depois replicá-las. Esse é o primeiro passo em direção ao desenvolvimento de uma nova variedade de laranja resistente ao greening – uma tecnologia que tem o potencial de revitalizar a produção de laranjas e seus derivados.
Essa característica foi descoberta em trifoliata(Poncirus trifoliata), uma espécie com frutos não muito agradáveis para consumo, mas amplamente utilizada como porta-enxerto. O trifoliata não exibe os sintomas típicos do greening, e a bactéria tem dificuldade em se proliferar nele.
Sempre que uma nova doença emerge, procuramos no banco ativo de germoplasma plantas que possam resistir a essa doença. Foi dessa maneira que identificamos a resposta diferenciada de trifoliata para infecção da bactéria C.Liberibacter. Dra. Mariângela Cristofani-Yaly – Centro de Citricultura Sylvio Moreira (IAC).
Pesquisadores estão no caminho para solução do greening
Uma vez que a característica de interesse é encontrada, os pesquisadores buscam compreender a origem dessa resistência – como ela funciona? Uma vez entendido, começam a elaborar estratégias para o desenvolvimento de tecnologias para proteção das plantas e/ou produção de frutos.
Resumidamente podemos destacar 3 etapas:
Pesquisa pela fonte de resistência/tolerância
Pesquisa para compreensão do mecanismo de resistência/tolerância
Pesquisa para desenvolvimento de uma nova tecnologia agrícola
Para segunda etapa, optamos como estratégia de pesquisa avaliar híbridos de trifoliata com tangerina Sunki (Citrus sunki) – espécie que é susceptível à doença. No BAG existem muitas plantas que são “filhos” do cruzamento dessas duas espécies (P. trifoliata X C. sunki), nosso objetivo era encontrar diferentes níveis de tolerância ao greening e com isso compreender a interação entre planta e bactéria que resultam na doença. – Dra. Mariângela Cristofani-Yaly – Centro de Citricultura Sylvio Moreira (IAC).
Os resultados foram promissores. Entre mais de 100 plantas filhas de P. trifoliata X C. sunki que estão no BAG, os pesquisadores encontraram diferença de resposta à infecção pela C. Liberibacter – quantidade de bactéria na planta e aumento na produção de amido.
Com isso, os híbridos foram separados em 3 grupos:
Susceptíveis: Presença de bactéria com aumento nos níveis de amido e calose
Tolerantes: Presença de bactéria sem alteração significativa nos níveis de amido e calose
Resistentes: Ausência da bactéria e sem alteração significativa nos níveis de amido e calose.
Resistência ao greening está relacionado em como a planta responde à infecção pela bactéria
Com a separação em três grupos de plantas, os pesquisadores conseguem analisar as sequências genéticas dessas plantas – genoma e genes. Para isso, foi utilizado uma estratégia bastante interessante.
Uma vez que estavam trabalhando com um número grande de híbridos entre planta resistente e susceptível, os pesquisadores quiseram investigar como ocorreu a transferência de genes dos pais para os filhos e como alguns genes “funcionavam” nos filhos (quais estavam sendo mais ou menos ligados e desligados) – chamamos isso de expressão gênica associada ao mapa genético.
Queríamos descobrir se a resistência encontrada em trifoliata e alguns de seus filhos era devido a um ou mais genes. Como esses genes eram passados de pais para filhos (a frequência) e qual seria a posição deles no genoma da planta (se estavam em um ou mais cromossomos).Com isso podemos isolar os genes relacionados à maior tolerância para utilizar em trabalhos de transformação genética ou edição genética. – Dra. Mariângela Cristofani-Yaly – Centro de Citricultura Sylvio Moreira (IAC).
Uma das soluções para o greening pode estar na calose
Após a construção e análise da expressão gênica associada ao mapa genético. Os pesquisadores conseguiram identificar que a família de genes envolvida na produção de calose, era de fato alterada nas plantas infectadas pela bactéria causadora do greening. E o mais interessante: As plantas resistentes apresentaram uma regulação negativa (desligavam os genes da calose) e as plantas susceptíveis tinham uma regulação positiva para os genes da calose (estavam ligando e aumentando a produção).
Mas não é só isso, o grupo de pesquisa da Dra. Mariângela também encontrou outras regiões, no mapa genético, associadas à tolerância ao greening, revelando que a característica de resistência, vista em trifoliata, envolve muitos genes. No entanto, existe uma alta herdabilidade desses genes (“facilidade” em serem passados para os filhos) o que indica que a seleção para resistência, pelo cruzamento entre plantas, pode ser realizada com sucesso.
Resultados que abrem portas para o desenvolvimento de novas tecnologias agrícolas
Todo o trabalho da Dra. Mariângela e colaboradores para a caracterização de híbridos resistentes ao greening, a identificação de genes envolvidos na resistência, o posicionamento desses genes no genoma e a taxa de herdabilidade (chances de serem passados aos filhos) são informações importantes para o desenvolvimento de novas variedades de laranjas, tangerinas e mexericas resistentes ou tolerantes a C. Liberibacter.
O desenvolvimento de novas tecnologias no campo da citricultura está em pleno andamento, abrangendo uma variedade de estratégias que vão desde o melhoramento genético convencional até o emprego de avanços em biotecnologia. Uma série de esforços significativos está em andamento para acelerar a implementação dessas inovações, com o INCT Citros se destacando como um dos principais projetos de pesquisa dedicados a oferecer soluções promissoras nessa área.
Referências
Curtolo, M., et at. Expression Quantitative Trait Loci (eQTL) mapping for callose synthases in intergeneric hybrids of Citrus challenged with the bacteria Candidatus Liberibacter asiaticus. Genetics and Molecular Biology, 2020.
Soratto, T. A. T., et al. QTL and eQTL mapping associated with host response to Candidatus Liberibacter asiaticus in citrandarins. Tropical Plant Pathology, 2020.
Boava L.P., et al. Physiologic, anatomic, and gene expression changes in Citrus sunki, Poncirus trifoliata, and Their Hybrids After ‘Candidatus Liberibacter asiaticus’ Infection. Phytopathology, 2017.
Complete o formulário ao lado e deixe sua mensagem ou comentário para a equipe do INCT CITROS. Seus dados são protegidos e utilizados unicamente pela equipe do projeto para retornar o contato.