Plantas transgênicas são alternativas para o desenvolvimento de laranjeiras mais resistentes ao cancro cítrico, promovendo sustentabilidade na citricultura.
A citricultura enfrenta grandes desafios fitossanitários, devido, principalmente, à ausência de cultivares de laranjas doces resistentes a bactérias causadoras de doenças, entre elas o cancro cítrico, causado pela bactéria Xanthomonas citri subsp. citri (Xcc). Buscando criar soluções eficazes, pesquisadores do INCT Citros estão utilizando ferramentas biotecnológicas para desenvolver plantas transgênicas resistentes ao cancro cítrico.
Há pelo menos 65 anos, o cancro cítrico tem sido uma fonte constante de problemas para os citricultores paulistas
A bactéria X. citri foi identificada pela primeira vez no Estado de São Paulo em 1957, na região de Presidente Prudente, e desde então tem se disseminado pelo país, principalmente dentro de SP.
O cancro cítrico, dependendo do seu grau de severidade, causa desfolha, depreciação e queda prematura dos frutos. Como resultado, existe uma diminuição na produção e dificuldade de comercialização dos frutos. O controle e prevenção do cancro cítrico é realizado com a aplicação de produtos à base de cobre e, em casos mais graves, com a erradicação das plantas contaminadas.
Plantas Transgênicas: Uma Solução Inovadora para o Cancro Cítrico
A biotecnologia se destaca como uma ferramenta eficaz para acelerar o processo de criação de novas cultivares, e o desenvolvimento de plantas transgênicas resistentes ao cancro cítrico surgem como uma oportunidade promissora para introduzir novas cultivares de laranjas doces como soluções para o controle desta doença em um período mais curto.
O termo transgênico foi adotado para descrever organismos que receberam genes de outra espécie por meio da biotecnologia – técnicas moleculares utilizadas por pesquisadores para isolar, copiar e transferir sequências específicas de DNA.
Dessa forma, plantas transgênicas são aquelas que incorporam em seu genoma sequências de DNA (genes) de uma espécie não compatível sexualmente. Essa espécie pode ser uma planta, um microrganismo, um animal ou qualquer organismo vivo. Esse processo de modificação genética visa conferir às plantas características específicas, tais como resistência a doenças, como é o caso do cancro cítrico.
Essa abordagem inovadora apresenta a vantagem de acelerar o desenvolvimento de cultivares mais robustas e adaptadas, representando uma estratégia eficiente para enfrentar os desafios na citricultura.
Pesquisa do INCT Citros no desenvolvimento de plantas transgênicas resistentes ao Cancro cítrico
O grupo de pesquisa liderado pelo Dr. Francisco Mourão, pesquisador da equipe de pesquisa da plataforma de genômica funcional e melhoramento assistido do INCT Citros, conseguiu desenvolver, por meio da biotecnologia, plantas transgênicas de laranja doce cv. Hamlin (Citrus sinensis L. Osbeck). A pesquisa contou com a colaboração de pesquisadores do Instituto Biológico e da Embrapa. São dois “tipos” de abordagens:
Plantas transgênicas com o gene d4e1
Plantas transgênicas com o gene csd1
O gene d4e1 é um peptídeo sintético e apresenta atividades antimicrobianas já comprovadas e, o gene csd1, produz um superóxido dismutase de cobre e zincoque é uma enzima antioxidante com atividade comprovada para resistência a estresses bióticos e abióticos. Dr. Francisco Mourão – Universidade de São Paulo, ESALQ.
Desafiando as plantas transgênicas frente a bactéria causadora do cancro cítrico
Após a confirmação da presença dos genes d4e1 ou csd1 em plantas de laranja doce, os pesquisadores embarcaram em uma outra fase do estudo: a avaliação do funcionamento desses genes nas plantas e a verificação de sua eficácia em fortalecer a defesa contra a bactéria causadora do cancro cítrico.
Quando trabalhamos com transformação genética é comum termos mais de uma planta transgênica para cada gene. Por exemplo, em nosso trabalho conseguimos 13 plantas de laranja com o gene csd1, chamamos cada uma dessas plantas de “evento transgênico”. Realizamos diversos experimentos a fim de identificar o evento em que o gene “funciona melhor”. Explica Dr. Matheus Luís Docema, pesquisador que estudou, em sua tese de doutorado, a resposta dessas plantas transgênicas à infecção por essa doença.
A validação do papel desses genes na resistência à bactéria é essencial para garantir o sucesso da abordagem transgênica no desenvolvimento de cultivares mais robustas e resilientes.
Para selecionar o melhor evento, é preciso colocar a planta para “brigar” com a bactéria. Uma das formas de se conseguir isso é:
Primeiramente a bactéria é crescida em um meio de cultura, em seguida, é diluída em uma solução de inóculo para uma concentração conhecida. Dessa forma, os pesquisadores conseguem inocular sempre a mesma concentração de bactérias em diferentes plantas.
A pesquisa realizada levou em consideração duas estratégias de inoculação:
“Spray”, na qual a solução de inóculo é pulverizada na superfície das folhas de laranjeiras
“Ferida”, na qual a “micro agulhas” são imersas na solução de inóculo e então utilizadas para fazer micro furos na superfície das folhas.
Para chegar em resultados confiáveis e replicáveis, os pesquisadores trabalharam com 12 repetições, sendo cada repetição representada por uma única planta, tanto para os eventos transgênicos quanto para os grupos de controle (plantas não transgênicas). Esse arranjo experimental foi repetido três vezes.
Com isso, foi realizado um estudo comparativo e bastante aprofundado entre plantas transgênicas e plantas não transgênicas. Os pesquisadores conseguiram então, avaliar a presença e ausência de bactérias e sintomas nas plantas, assim como a intensidade nas respostas moleculares de defesa das plantas.
A presença dos genes d4e1 ou csd1 faz com que plantas de laranja doce resistam ao cancro cítrico
Em geral, os pesquisadores confirmaram que a incidência e severidade do cancro cítrico em plantas transgênicas de laranja foram reduzidas. Tanto em eventos com o gene d4e1 como em eventos com o gene csd1, quando comparadas às plantas não transgênicas.
Nessas plantas, a bactéria proliferou com menos severidade, resultando em baixas progressões da doença nas laranjeiras transgênicas. As análises anatômicas e o atraso nos sintomas visuais em alguns eventos transgênicos sugerem uma diminuição considerável na gravidade da doença.
Nós também identificamos que a resistência encontrada em plantas de laranja com o gene csd1 é devido a uma maior atividade de enzimas antioxidantes. Além disso, encontramos maior deposição de calose, aumento no tamanho das células (hipertrofia) e aumento no número de células (hiperplasia), especialmente, nas proximidades dos estômatos. Respostas que desempenham um papel crucial na defesa contra patógenos. Dr. Matheus Luís Docema – Universidade de São Paulo, ESALQ.
Com essa publicação científica, o projeto INCT Citros, liderado pela equipe do Dr. Francisco Mourão, apresenta duas novas abordagens para o controle do cancro cítrico em laranjas doces. Os resultados dessa pesquisa abrem portas para o desenvolvimento potencial de cultivares de laranjeiras mais resistentes ao cancro cítrico, contribuindo significativamente para a sustentabilidade da produção citrícola.
No entanto, é importante ressaltar que mais estudos, incluindo testes de campo, são necessários para validar plenamente a eficácia dessas estratégias inovadoras. O trabalho desses pesquisadores representa um passo promissor rumo a um futuro mais resiliente para as plantações de citros em todo o mundo.
Referências
Docema, M. L., et at. Transgenic ‘Hamlin’ sweet orange expressing csd1 or d4e1 genes exhibits decreased susceptibility to citrus canker disease, 2022.
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